Com a chegada ao nosso destino, na margem esquerda do Rio Luanguinga, iniciou-se a guerra que nos foi imposta a vós, elementos da CArt 3514, pela primeira vez, com uma excepção: para mim, era pela terceira vez. Era um ambiente diferente daquele a que estava habituado nas anteriores comissões, mas como é habitual nos seres humanos, adaptamo-nos muito facilmente a novos ambientes. A primeira característica que estranhei, logo de início, foi as da vegetação, muito diferente da de Cabinda, em que predominavam árvores seculares e de tal altura, tão compactas que em pleno meio-dia, no solo que as suportava, mal entravam os raios do sol. A vegetação do norte de Angola, não era tão alta, mas era também bastante espessa e a iluminação, rente ao solo era também algo deficiente. Na vegetação do leste de Angola muito raramente se viam arvores muito altas e a predominância era a da vegetação arbustiva de espinhosas, típica das zonas semi-desérticas, de solo arenoso, como era o daquela área. Anexo aqui uma imagem elucidativa de tais características.
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Chana no Leste de Angola, com solo arenoso e vegetação típica. Ao fundo, um destacamento, c/barracas cónicas de lona. |
Mas, voltando ao rumo da minha história, ficámos alojados em instalações que deixou a CCaç 3370, que fôramos render. Os próprios fizeram correr umas histórias que confirmaram a que nos agoiravam os militares com que nos cruzáramos no caminho para ali. Diziam eles, quando lhes respondíamos que íamos para o Luanguinga: “Cuidado!...A companhia que lá está tem tido bastantes azares com emboscadas e com as minas A/C e A/P ” . Estivemos em sobreposição uns poucos dias. A missão da CArt 3514, era dar protecção aos trabalhos de construção da estrada Luso-Luiana e assim ficamos distribuídos por três locais diferentes: Luanguinga, um outro, num rio perto de Lutembo, de que não recordo o nome e o outro no Lutembo. No Luanguinga ficaram o comando e dois GC. O tempo decorria lento, mas calmamente, sem nenhuma ocorrência hostil por parte do IN. Mas o azar, que sempre nos espreitara à espera de oportunidade, surgiu inesperadamente. Decorria o dia 7 de Maio 72, num domingo, em que os rapazes do GC que estava no Lutembo, tinham realizado um jogo de futebol e findo o mesmo resolveram ir refrescar-se com um banho para as margens do rio próximo. Um deles, de nome Ernesto Gomes, durante o banho foi acometido por um qualquer acidente que originou que o mesmo, repentinamente, se submergisse nas águas que eram profundas, tendo desaparecido nas mesmas. Fizeram-se buscas exaustivas, mas só foi encontrado o cadáver dois dias depois. Era o dia 26º. de comissão no mato e já tínhamos um morto em acidente. Passaram três dias da data em que deveria ter sido relembrado o nosso camarada Ernesto Gomes. Mas como lá diz o ditado: “Mais vale tarde do que nunca”, aqui vai a evocação daquele nosso camarada que, tão cedo se despediu de nós, até hoje.
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Anexo aqui uma imagem representando aquele nosso camarada, de quem me despeço com um “até um destes dias, camarada Gomes!” Um mês ou dois depois desta ocorrência, o Comando da CArt é transferido para o Quartel de Gago Coutinho, onde o pessoal já tinha umas instalações mais confortáveis e melhores condições de vida, isto para o pessoal do Comando, pois que o que estava em destacamentos tipo nómada, uma vez que tinham de deslocar-se continuamente acompanhando a evolução e avanço dos trabalhos de estrada, evidentemente, estavam em piores condições, vivendo em barracas cónicas de lona. Por isso os destacamentos eram de curta duração, procedendo-se à substituição com outro GC que saía do Comando para os destacamentos para que pudessem mudar de ambiente e descansarem um pouco mais, pois que o serviço num destacamento era excessivamente pesado e com muitas limitações em todos os aspectos. Poder-se-ia dizer que levavam uma vida de “cão”.
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O saudoso Ernesto Gomes, falecido em 07MAI72, ao 26º. dia de comissão no Leste de Angola |
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Um destacamento da CArt 3514, no Leste de Angola(1972-1974) |
Aqui vai uma imagem que mostra um destacamento e o seu ambiente. Este “post”está a atingir os limites a que me propus e, por isso, vou encerrá-lo, enviando cordiais saudações para todos os elementos da CArt 3514 e seus familiares, para os ex-combatentes da CArt 785 e elementos da CArt 2396, assim como para todos os visitantes deste Blogue, estejam onde estiverem, se derem ao trabalho de o ler. Para todos, um até breve com um abraço do Camarada e Amigo,
Octávio Botelho