Situo a narrativa
deste Capítulo, na antiga Vila de Gago Coutinho, actualmente conhecida pelo
nome de Lumbala Nguimbo, onde a vida, para mim, era de uma monotonia
desesperadora. Tal condição fazia com que tentássemos passar o tempo da melhor
maneira possível, aventurando-nos em passeios pelas redondezas da vila que não
era, em realidade muito extensa, uma vez que a sua área urbanizada mais
compacta, correspondia aproximadamente a quarenta hectares e meio. Era e é uma vila situada no meio de nenhures, sem
povoações vizinhas próximas, a não ser as típicas sanzalas indígenas que, ao
tempo, rodeavam a povoação por quase todos os lados. Das casas dos europeus,
não tenho qualquer imagem, pois as mesmas
em si, se revelavam pouco interessantes pois eram cópias fiéis das casas
que tinham na Europa e não tinham na sua construção ou estilo qualquer exotismo
que despertasse interesse. Outro tanto já não posso dizer das habitações
indígenas que, a par do exotismo da sua construção(madeira, nas estruturas e
colmo(capim), nas paredes e tectos) que
são típicas daquela região.
O autor numa sanzala em GagoCoutinho |
Anexo aqui uma
imagem dumas dessas casas(cubatas), que mesmo com a pobreza dos materiais à sua
disposição, já tentam uma imitação dos europeus, construindo em anexo à sua
cubata, um alpendre com uma espreguiçadeira, feita de aduelas de barril, para
fazerem as suas sestas à sombra, fora dos raios ardentes do sol. Pela minha
parte, achava e acho ainda muito bem , que os autóctones tenham e gozem das
suas comodidades. Tinham também uma bonita igreja, situada na periferia de um
arvoredo, por de trás do qual se encontrava e encontra ainda hoje a Missão
Católica de São Bonifácio, atribuída a uma Comunidade de Irmãs que têm
variadíssimas missões de carácter religioso, escolar e social em benefício das
populações locais. Da linda igreja que lá deixámos, hoje, infelizmente,
apenas restam ruínas e como lembrança do edifício sagrado desaparecido, anexo,
a seguir, uma imagem do mesmo tal como era outrora.
Igreja da Missão de S.Bonifácio, em Gago Coutinho, em 1974 |
Voltando a falar do
estilo de vida naquela vila, era certo que mensalmente e por motivos administrativos tinha de ir
levantar fundos para pagamentos de ordenados, vencimentos e pré,
deslocando-me ao Luso, actual Luena. Para essas deslocações, não era permitido
usar transporte terrestre, mas sim a via aérea, para afastar a possibilidade de
se perderem, nalguma emboscada, os valores que transportávamos. Para o Luso,
transportava um cheque da RV/RO/QG/RMA, sobre o Banco de Angola, anexado à
relação e recibos individuais mecanografados, dos vencimentos de todo o pessoal da CArt. Assim,
para obstar à perda de valores que poderiam ocorrer numa viagem por via terrestre de mais de 300 Km , usava-se, por
imposição, a opção de via aérea, mas, imagine-se!...Num caco velho, usado na II
Guerra Mundial pelos Aliados, um avião bi-motor, de fabrico francês, de nome “NordAtlas”,
aportuguesado para “Noratlas”, que era, essencialmente, um avião de transporte de
Materiais, transporte e lançamento de tropas“Páraquedistas”. Era, portanto, um
avião sem insonorização, com armação metálica e sobre esta, a chapa metálica
exterior. Lá dentro, durante o voo, era uma barulheira desgraçada dos motores.
Quando se atravessavam os “poços de ar” em corrente descendente, o avião caía e
tínhamos a impressão de que o estômago ia sair pela boca.Chegado o aparelho às
correntes ascendentes, lá voltava para a altitude de segurança, até que
atingisse outra corrente descendente que ameaçava despenhar o avião para a floresta. Numa meia
hora de voo dávamos meia dúzia de mergulhos em direcção à terra e só respirávamos aliviados,
depois de por os pés em terra no fim da viagem.
O avião "Noratlas", vulgarmente chamado de "barriga de jinguga" |
Aqui, junto uma
fotografia do aparelho em questão que, ao ser visto na imagem não desperta
tanta insegurança como se possa pensar. E a verdade é que não aconteceu,que eu saiba, durante a guerra colonial, nenhum acidente com os velhos “Noratlas”,o que prova a perícia
e cuidado dos mecânicos da FAP, na manutenção dos velhos aviões que possuíam.
Este “post” já está a atingir os limites que me propus atingir e assim, vou
encerrá-lo, enviando cordiais saudações para todos os elementos da ex-CArt 3514 e seus familiares,
assim como para todos os que compuseram as CArts 785/BArt 786 e CArt 2396/BArt 2849 e
ainda para os eventuais visitantes deste Blogue onde quer que estejam. Para todos, vai um
abraço e um até breve do Camarada e Amigo,
Octávio Botelho