Espero que o título deste capítulo vos não faça crer que acredito em “Fantasmas”. Este vocábulo é utilizado apenas para ilustrar literariamente o episódio que me proponho narrar-vos hoje e, após este breve e fantasmagórico preâmbulo vou prosseguir: Como já referi anteriormente, tínhamos nesta época uma grande actividade operacional, cuja preparação deveria ser feita na tarde da véspera e, no dia seguinte, de manhã, muito cedo completavam-se os últimos preparativos para que nada faltasse. Ora no dia em que iniciaríamos o deslocamento para o local em que se iniciaria a “operação”, a mesma ia desenrolar-se numa estação chamada do “cacimbo” ou “seca”(*), que se caracteriza por escassez de pluviosidade, mas, em compensação, durante a noite e madrugada, levantam-se enormes bancos de um nevoeiro saturado de humidade(o cacimbo) e que perdura até às 9 a 10 horas da manhã, só desaparecendo quando o sol já vai alto. A propósito, recorda-se que era recomendado que, em viagens nocturnas e em dormidas ao ar livre, houvesse cuidado de nos resguardarmos do cacimbo, por ser possível apanhar algumas doenças do foro respiratório e outras não menos graves. Até diziam que podia ser atingida a área psiquiátrica, pois era vulgaríssimo tratar-se os doentes dessa área por “cacimbados”.
.Cerração de "cacimbo" em Angola |
E os fantasmas” onde estão?!...Até agora não apareceram!... Esperem só mais um pouquinho e já os verão!...Ei-los: É madrugada!...Aí pelas quatro a cinco da manhã!...No exterior das casernas, está frio, um frio intenso e húmido e há um nevoeiro cerrado envolvendo o ambiente!...Primeiro, aparece um vulto indefinido, depois outro e mais outro. Não se consegue distinguir quem é quem, pois as palavras proferidas são poucas e mal articuladas!..Parecem na verdade “fantasmas” saídos de um sonho de pesadelo .Há pouco, estava tudo em silêncio e, de repente, ouve-se um rumor surdo e vago dos militares em movimento. Tem que se fazer o mínimo de barulho, pois há muitos outros camaradas que estão a descansar e não devem ser acordados!... Ouve-se em simultâneo o movimentar das “Mercedes”, dos “Unimogs 411 e 404” e dos Jeeps. Os vultos encaminham-se para o telheiro da padaria, onde, ao longo da noite, esteve o nosso “boulanger” com os seus ajudantes a cozerem o pão para o dia da Companhia e para os GC levarem para a mata, guardados em sacos de plástico para durarem frescos mais tempo e terão que durar para cinco ou seis dias. As R/C já tinham sido fornecidas na véspera à tarde, assim como o reforço de municiamento e a distribuição do armamento pesado. Quanto à dotação individual de munições, essa estava continuamente actualizada e pronta a ser utilizada em qualquer emergência.
.Ração de Combate, tipo E |
Octávio Botelho
(*)-Nota do Redactor – Em Angola, a estação do “cacimbo” ou “seca”, decorre de Maio a Setembro; a das “chuvas”, de Outubro a Abril.